Reflexões sobre o Uso Ético da Punição no Treinamento de Cães: Experiências de um Adestrador Profissional

Por Aguinaldo Diniz Trainer NLP

 

 

Como adestrador profissional de cães com mais de 30 anos de experiência, tendo treinado mais de 20 mil cães ao longo da minha carreira, continuo aprendendo e me aprimorando constantemente no campo do treinamento canino. Ao longo dessas décadas dedicadas ao trabalho com cães, tenho testemunhado uma variedade de métodos e técnicas de treinamento e tenho visto de perto os desafios e as controvérsias que cercam a utilização da punição nesse contexto. Essa jornada de aprendizado contínuo tem me levado a refletir sobre a eficácia e a ética do uso da punição no treinamento de cães, especialmente em relação a comportamentos agressivos, e a buscar uma compreensão mais profunda das melhores práticas para promover o bem-estar dos animais e a segurança dos donos de cães.

A cada cão que tenho a oportunidade de treinar, percebo a individualidade de cada animal e a necessidade de abordagens personalizadas que levem em consideração sua individualidade, histórico e necessidades específicas. Enquanto alguns cães respondem bem ao reforço positivo e à motivação através de recompensas, outros podem apresentar desafios comportamentais que exigem uma abordagem mais assertiva, incluindo o uso criterioso da punição. No entanto, é fundamental reconhecer que a punição deve ser aplicada com sensibilidade e discernimento, priorizando sempre o bem-estar emocional do cão e evitando qualquer forma de crueldade ou abuso.

Ao longo da minha carreira, tenho presenciado os resultados positivos que podem ser alcançados com o uso responsável da punição no treinamento de cães, especialmente quando combinado com técnicas de reforço positivo e uma compreensão profunda do comportamento animal. Em muitos casos, a punição adequada e bem aplicada tem sido crucial para corrigir comportamentos perigosos, como agressão direcionada a outros animais ou humanos, reatividade excessiva a estímulos externos, comportamento possessivo em relação a recursos, como comida ou brinquedos, e comportamento predatório descontrolado, como perseguir bicicletas ou carros.

Esses comportamentos representam não apenas riscos para a segurança dos próprios cães, mas também para seus donos e para a comunidade em geral. Por exemplo, um cão agressivo pode representar um perigo para outros animais de estimação em um parque, resultando em ferimentos graves ou até mesmo morte. Da mesma forma, a reatividade excessiva de um cão a estímulos externos, como barulhos altos ou movimentos rápidos, pode resultar em situações perigosas, como fugas que colocam o próprio cão em perigo ou interações agressivas com estranhos. Portanto, é essencial abordar esses comportamentos de maneira eficaz e ética para garantir a segurança e o bem-estar de todos os envolvidos.

Além das técnicas tradicionais de treinamento canino, avanços recentes na compreensão do funcionamento do cérebro animal têm contribuído significativamente para o desenvolvimento de métodos mais eficazes e éticos de treinamento. Um dos principais nomes nesse campo é Michael Merzenich, um neurocientista renomado por suas pesquisas sobre plasticidade cerebral e aprendizado. Merzenich demonstrou que o cérebro dos animais, incluindo os cães, é altamente maleável e pode ser moldado por meio de estímulos e experiências.

As descobertas de Merzenich sobre a plasticidade cerebral têm implicações profundas no treinamento de cães. Elas sugerem que os padrões comportamentais indesejados podem ser modificados por meio de estímulos específicos e repetição, o que abre caminho para abordagens de treinamento mais eficazes e compassivas. Por exemplo, ao utilizar técnicas de treinamento que visam criar novas conexões neurais associadas a comportamentos desejados, os adestradores podem ajudar os cães a superar medos, ansiedades e comportamentos agressivos sem recorrer a métodos punitivos severos.

No entanto, é importante reconhecer que a aplicação prática das descobertas de Merzenich requer uma compreensão profunda das nuances do comportamento animal e uma abordagem individualizada para cada cão. Nem todos os cães responderão da mesma maneira aos mesmos estímulos, e é fundamental adaptar as técnicas de treinamento de acordo com as necessidades e preferências de cada animal. Além disso, o uso da punição ainda pode ser necessário em certos casos para interromper comportamentos perigosos imediatamente, mas deve ser feito com cuidado e consideração para não causar danos físicos ou emocionais ao cão.

Em suma, a punição no treinamento de cães é uma ferramenta que, quando aplicada com sensibilidade e discernimento, pode desempenhar um papel importante na correção de comportamentos perigosos e na promoção da segurança e do bem-estar dos animais e de seus donos. No entanto, seu uso deve ser complementado por técnicas baseadas na compreensão da plasticidade cerebral e do comportamento animal, como aquelas desenvolvidas com base nas pesquisas de Michael Merzenich. Ao integrar essas abordagens, os adestradores podem oferecer aos cães uma educação mais eficaz e compassiva, ajudando-os a se tornarem companheiros obedientes, confiantes e equilibrados.

 

28 de Abril de 2024

 

Aguinaldo Diniz Trainer NLP